Escola de Ciências e Tecnologia: 15 anos de um projeto grandioso e inovador

Escrito por: Camila Pinto | Publicado em: 23 de fevereiro de 2024

Escola de Ciências e Tecnologia em 2024. Foto: Carllos Delfino.

Em dezembro de 2023, a Escola de Ciências e Tecnologia (ECT) completou 15 anos da sua criação, conforme resolução Resolução Nº 012/2008-CONSUNI, de 1º de dezembro de 2008 da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Essa Unidade Acadêmica Especializada é responsável por um dos projetos mais ousados e grandiosos da universidade: o curso de Ciências e Tecnologia (C&T).

Inspirado no modelo europeu de Bolonha, o projeto fazia parte de uma série de cursos de bacharelado interdisciplinar criados em todo o Brasil, como medida do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), de 2007, instituído pelo Governo Federal. O objetivo desses cursos era proporcionar uma formação básica científica e tecnológica para cursos de Engenharia e, assim, reduzir a evasão de estudantes na área.

O início de um sonho ousado

Prédio da ECT em construção. Foto: acervo de Filipe Borges.

A história da ECT tem origem numa discussão antiga da área de engenharia sobre a necessidade de uma formação científica básica e unificada para os estudantes que ingressam nessa área. Nos departamentos de Engenharia da UFRN, uma proposta de curso que atendia a essa necessidade já havia sido elaborada, mas descartada. Com a chegada do Reuni em 2007 essa proposta foi retomada pela Reitoria no ano seguinte, que propôs não apenas a criação do curso de C&T, como também a de uma unidade acadêmica que desse o suporte necessário para o projeto.

Para elaborar a proposta do que viria a ser a ECT e o curso de C&T, o então reitor da UFRN, José Ivonildo do Rego, convidou o professor Enilson Medeiros dos Santos, do Departamento de Engenharia Civil, que posteriormente assumiria a primeira direção da escola. O ex-diretor conta que o projeto era inédito na UFRN: “A universidade tinha algumas unidades acadêmicas especializadas, mas nenhuma tinha essa configuração de imbricação total entre o pedagógico e o administrativo”. Essa configuração deu autossuficiência à ECT, pois abarcava, num prédio só, as salas de aula, os laboratórios, as secretarias e as salas de professores.

O modelo de formação do curso em dois ciclos era inovador e se inspirava no Processo de Bolonha utilizado no ensino superior da União Europeia desde a década de 1990. “A gente pensou na possibilidade de que [o curso] tivesse o caráter europeu, ou seja, de formação forte na área de ciências básicas da engenharia, mas que também desse uma formação profissional. Essa possibilidade de o aluno se profissionalizar a partir desse primeiro curso de três anos virou o Bacharelado em Ciências e Tecnologia”, explica Enilson.

Além disso, o tamanho da ECT era outro grande diferencial. A primeira turma de estudantes a ingressar no curso de C&T no segundo semestre de 2009 era composta por 500 alunos, com previsão de mil vagas por ano. De acordo com dados do e-MEC, o Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia da UFRN é, até hoje, o maior curso de graduação do Brasil. E ainda que o número de vagas tenha sido reduzido com o tempo, mais de três mil estudantes se formaram ao longo desses 15 anos.

O professor Marcos Dias, vice-diretor ao lado de Enilson e responsável por tocar a parte administrativa da ECT, conta que uma das preocupações naquele início era onde colocar todos aqueles alunos, já que o prédio ainda estava em construção. Na época, foram disponibilizados anfiteatros do Centro de Ciências Exatas e da Terra (CCET) e do Centro de Biociências (CB) da UFRN. “As provas eram realizadas aos sábados no Setor de Aulas 4. Parecia um mini vestibular. Mobilizavam-se todos os professores da escola, a direção e os funcionários para realizar essas provas”, relembra o professor.

Somente em agosto de 2010 o prédio, ainda coberto de tapumes e com obras por finalizar,  foi ocupado pelos estudantes e pelos servidores. Em abril de 2011, na presença do então Ministro da Educação Fernando Haddad, que a Escola de Ciências e Tecnologia foi inaugurada.

Primeira turma de alunos do curso de Ciências e Tecnologia. Foto: Acervo de Filipe Borges.

Um sonho que se constrói em conjunto

Apesar de ter sido elaborado inicialmente junto com a proposta de criação da ECT, o Projeto Pedagógico (PP) do curso de C&T foi reformulado pelo corpo docente e técnico-administrativo da ECT. “Normalmente, quando um professor ingressa numa universidade para lecionar em um curso, o projeto pedagógico já está pronto. No caso do bacharelado em C&T, não. Existia um projeto inicial, mas como as aulas só iriam começar no segundo semestre e nós entramos em janeiro, foi nos dada a possibilidade de alterar o projeto pedagógico para que ele tivesse a cara dos professores que estavam entrando”, comenta o professor Rex Medeiros, primeiro coordenador do curso de C&T entre os anos de 2009 e 2011 e primeiro diretor eleito da ECT, para o mandato de 2011 a 2015.

O desafio era ainda maior ao considerar que a maioria dos professores estavam tendo a sua primeira experiência como professores universitários. Isso ajudou a moldar o perfil da ECT. “A gente queria iniciar uma coisa nova sem os vícios, sem os vícios que a gente tem nos nossos departamentos”, comenta Enilson.

“Eu costumo dizer que é mais fácil pegar uma situação com o trem já andando, mas quando a gente vai montar tudo do zero, já fica mais difícil. A gente teve de se virar para aprender tudo, mesmo sem ter qualquer experiência, mas sempre dispostos a servir, ajudar, atender com educação e carinho cada um que passou por nosso setor, e isso fez toda diferença, para quem atendemos e para cada um de nós mesmos”, reflete Ana Rosa, primeira servidora técnica administrativa da ECT.

Ainda que fosse um grande desafio, muitas decisões importantes para o funcionamento da ECT e do curso foram tomadas naqueles primeiros seis meses, como a criação das câmaras temáticas, a estrutura dos laboratórios e das salas e os componentes curriculares que precisavam se adaptar à realidade do novo curso. O professor Filipe Borges, que compõe a primeira turma de docentes da ECT, comenta que, na época, ele e a professora Tatiana Bicudo se dividiam entre elaborar o componente de Química, inicialmente denominado “Química Tecnológica’, e montar o laboratório, solicitando materiais e orientando a sua construção.

Ele conta ainda que aquele período inicial foi um momento muito importante para que os professores das diferentes áreas construíssem laços e também parcerias entre os componentes curriculares forma interdisciplinar, aspecto importante na identidade do curso de C&T e da própria ECT.

Sobre isso, a professora Glícia Azevedo, que foi vice-diretora ao lado de Rex e uma das responsáveis por criar a área de Práticas de Leitura e Escrita, comenta que “um dos maiores desafios de quem trabalha na ECT é pensar de forma inter-multi-transdisciplinar, numa formação transdisciplinar, quando na verdade, a própria formação foi disciplinar. Para isso, a gente tem de sair da caixinha da formação específica e começar a dialogar com outras áreas, traçando possibilidades de parceria”.

Registro do Laboratório de Ensino de Química da ECT durante a construção do prédio. Foto: Acervo de Filipe Borges.

Um projeto que vem dando certo 

Ainda que a ECT tenha sido criada para dar suporte ao curso de C&T, a graduação é apenas uma parte do que ela é hoje em dia. Ao longo dos anos, novos projetos foram surgindo para agregar conhecimento e inovação à universidade e à sociedade.

Atualmente a ECT conta com três programas de pós-graduação ofertando cursos de mestrado: o Programa de Pós-graduação em Ciência, Tecnologia e Inovação (PPgCTI), criado em 2015; o Programa Nacional de Mestrado Profissional em Ensino de Física (MNPEF) também de 2015; e o mais recente, o Programa de Pós-graduação em Engenharia Aeroespacial (PPGEA), implementado em 2019.

Além disso, um dos eixos mais fortes da ECT desde a sua concepção tem sido a inovação. Ao longo desses anos, a unidade vem se destacando e se tornando referência no setor de empreendedorismo e de negócios tecnológicos. A criação da Câmara de Negócios Tecnológicos e de projetos como a Empresa Júnior da Escola de Ciência e Tecnologia (EJECT), a Incubadora de Processos Acadêmicos, Científicos, Tecnológicos e Aplicados (InPACTA) e o próprio PPgCTI, têm contribuído para a inserção de egressos da ECT no mercado de trabalho a partir de ideias gestadas dentro da escola e da universidade que visam a mudanças na sociedade. O professor Efrain Pantaleon Matamoros, que participou da criação de vários desses projetos, explica que esses projetos ajudaram a criar uma identidade para a ECT, para o curso de C&T e para os seus egressos.

Nesse mesmo alinhamento, a docente Zulmara de Carvalho, que participou da criação e da gestão do PPgCTI e também atuou na gestão da InPACTA, defende que a ECT “tem um papel muito importante na formação de recursos humanos estratégicos para o país, e eu acho que isso teria de ter mais visibilidade, mais oportunidades para que a escola possa apresentar as suas potencialidades, que são inúmeras”.

Outro ponto forte da ECT tem sido as atividades de pesquisa e de extensão realizadas na unidade. Devido ao aspecto multidisciplinar dos seus cursos, a produção de conhecimento científico tem se destacado nacional e internacionalmente. Essas atividades têm proporcionado um diálogo contínuo e valioso com a comunidade acadêmica interna, quanto com a comunidade externa.

“Nós temos muitos alunos egressos que estão espalhados aí pelo mundo e que estão se destacando como profissionais. Isso mostra que os nossos cursos promovem uma boa formação”, destaca a professora Kaline Viana, atual diretora da ECT.

O que esperar da ECT no futuro

Em 2023, o curso de C&T recebeu, pela primeira vez, o conceito 5, nota máxima na avaliação do MEC para cursos de graduação. Para a diretora essa nota é uma construção desses 15 anos de história e o resultado do esforço de todos os que integram o curso. Então é natural que um dos objetivos para os próximos anos seja o de manter essa nota.

A ECT, no entanto, é muito mais do que o curso de graduação. Nesse sentido, outro desafio destacado pela diretora é o de fazer com que a ECT seja reconhecida não apenas pelo seu tamanho ou pelo número expressivo de universitários que agrega, mas principalmente pelos projetos brilhantes desenvolvidos, seja na graduação, na pós-graduação, seja na extensão e na pesquisa.  Esse reconhecimento deve ser dentro da universidade e fora dela, a nível nacional e internacional. “A ECT foi criada pra ser gigante. E os nossos desafios também são grandes, naturalmente”, reflete a professora Kaline.

Foto: Jussier Lucas.